“Visualizado às 10:30”
Nem todas as ondas anárquicas libertárias europeias são capazes de nos arrancar da arma social mais afiada que eu conheço: a “moral”.
Não a dos “bons costumes”, ou da ética. Deixe-me ser bem claro. “Moral”, segundo o carioquês tradicional, significa ideia, atenção, interesse. Se eu “te dou moral”, valorizo você, se não, faço pouco caso. É mais ou menos por aí.
Eu bem acho que por trás disso pode haver uma pandemia disfarçada.
Enquanto essa geração está aí achando que tá “gata”, pode estar, na verdade, chupando bala com papel.
Assim que chegamos à adolescência, nos deparamos com a primeira vontade de sorrir pra alguém que não nos dá bola, nisso vem um amigo que nos diz: “rapaz, você tá dando muita moral”. Pronto! A câmera dá um giro de 360º e você acaba de descobrir o fantástico mundo da atração; leis físicas que vão governar o resto da sua vida solteira. Ganha quem souber administrá-la melhor e isso serve para todo o tipo de relação social, com ou sem sexo.
Esse jogo cria realmente uma energia sexual de primeira!
Nós costumamos valorizar aquilo que é raro e difícil, esse preciosismo é como se fosse o tempero baiano em cima das suas qualidades.
Gostamos de mistério, de imaginar, da vitória de conquistar aquilo que não estávamos certos se iríamos ter. Agir como um bom administrador confere a você um magnetismo, um atrativo. É como se estivéssemos enviando a seguinte mensagem: “olha, não sei ainda se você é bom o bastante pra mim”. Gera um nervosismo comparável ao de um processo seletivo numa nova empresa.
Parece ótimo, né? E é! Deve até fazer bem pra circulação e para algum chacra importante da filosofia oriental.
Mas assim como açúcar, sal e Sol, tudo que é bom geralmente tem a dose certa.
É algo grotescamente comum esse tipo de comportamento quando há pessoas numa roda de amigos, seja em alguma festa ou socialzinha qualquer, com as quais você não consegue nenhum contato visual pra poder dizer “prazer, Fulano”. Reparem que não estou dizendo “oi, eu te amo, sempre te amei, vamos transar!?”, mas sim “oi, somos um grupo de primatas interagindo, vamos tentar fazer o mínimo?”
A falta de urbanidade (ou educação mesmo) é corriqueira, muito usada como ferramenta para esse tal jogo de atração.
Pode até fazer com que um certo grupo de pessoas sintam-se desafiadas por você, mas não acredito que esse seja lá o melhor grupo do mundo, não. É bom dar uma observada; existe uma linha tênue entre demonstrar-se pouco acessível e ser babaquinha. Geralmente as pessoas tropeçam nessa linha, uns ficam eternamente lá pelo outro lado (o dos babaquinhas), como um personagem do ensino médio. O que se perde exatamente com isso?
Nunca vou esquecer um dia que perguntei a um amigo por quê ele não ia falar com uma garota específica, em que ele respondeu (com voz de bêbado): “o ego dela não cabe naquela calça 36”. Uau! – pensei.
Quantas histórias que poderiam ser e não foram, só porque as pessoas erram a mão?
A verdade é que ninguém nunca vai saber – e é aí que fica chato, quando as pessoas confundem independência afetiva, com ego inflado e passam anos ostentando o vazio.
Receber moral demais não é legal, concordo. Matar um cabrito desses como oferenda pra quem mal se conhece é como tomar um chumbinho social. As pessoas enxergam a carência como uma espécie de gripe espanhola do século XXI e acho que é por isso mesmo que algumas acabam metendo os pés pelas mãos.
Existe uma certa confusão no ar. Ter autoestima não é ser um comercial de perfume importado ambulante. Ser reservado é bacana, ser tímida pode ser sexy, mas fazer um tipo “Cara Valente”… Sério? Pra mim, é um pouco de imaturidade disfarçada.
Só uma geração exclusivista, egocêntrica e, de certa forma, insegura, é capaz de estragar toda a “brincadeira”.
Esses comportamentos sufocam e tiram a graça da única coisa legal de viver num planeta com habitantes pra cacete: a possibilidade de interagir e, quem sabe, tirar alguma coisa boa disso.