A realidade é que transformam a Sustentabilidade em uma grande lista de “NÃOs”
Eu acabei de voltar de uma viagem de uma semana pela Amazônia onde fui gravar um documentário. Cada vez que piso lá, vejo o que está acontecendo, converso com pessoas de todos os tipos que lá vivem, muitas certezas que eu tinha sobre sustentabilidade desmoronam. Outras se confirmam. Algumas respostas aparecem e surgem outras mil novas perguntas. Parece que quanto mais eu aprofundo esse assunto, mais questões aparecem.
Por isso hoje eu resolvi dividir algumas dessas questões aqui. Eu sei que esse é um espaço onde eu deveria dar dicas de sustentabilidade. Apontar caminhos. Enfim, dar respostas… mas eu vou fazer justamente o contrário.
Antes de mais nada, me angustia uma questão que vejo em vários veículos: eles transformam a sustentabilidade em uma grande lista de “nãos”: “Não deixe a torneira aberta, não demore no banho, não use o carro, não troque de celular todo ano”. Uma grande lista de proibições esfregada na cara justamente de pessoas que já lidam com um monte de problemas o dia todo. Não me admira que tenha muita gente querendo que a natureza se exploda pra poder tomar um banho quente de quarenta minutos ou não ter que enfrentar um busão lotado.
É óbvio que esses exemplos são mega importantes (por favor, leve-os em conta) mas a questão não é essa. Uma vez, há alguns anos, quando entrevistei o Mario Mantovani, então diretor do SOS Mata Atlântica, ele levantou justamente essa reflexão: sua angústia na época era pensar como apresentar para as pessoas o cuidar da natureza como uma lista de “sims”, algo divertido e alegre. Essa angústia gerou uma das campanhas mais fofas que já vi sobre o tema. “Faça Xixi No Banho”.
Campanha Faça Xixi no Banho, SOS Mata Atlântica, 2009 – Ao invés de falar sobre o que não devemos fazer, fala o que podemos fazer (e muitos já fazem) e que é melhor pro meio ambiente.
Por outro lado, quanto mais xafurdo na sustentabilidade mais as certezas que eu tinha vão por água abaixo. E abrir mão de nossas certezas frente a fatos novos é um exercício de desapego tão difícil quanto importante. Exemplo: Eu entrevistei no mês passado criadores de abelha que produzem mel no interior de São Paulo. Eles me disseram que as abelhas selvagens estão praticamente extintas no Estado.
Realmente ele está certo, reparem, hoje eu quase não vejo abelhas na cidade. Segundo os criadores com quem conversei, um dos grandes motivos da morte das abelhas é o uso de agrotóxicos nas plantações, por exemplo, de laranja, que é uma flor que elas adoram. Eu sou a maior apoiadora do movimento vegano (que não consome nada animal), porém, nesse caso específico do Estado, é muito mais prejudicial para as abelhas você tomar um suco de laranja do que comer o mel. Um soco no estômago, não?
Pois é, esse é só um dos exemplos, poderia listar outros vários de contradições desse tipo, ou levantar polêmicas sobre, por exemplo, a pessoa encher sua timeline com fotos de cachorrinhos abandonados enquanto usa cinto de jacaré, bolsa de cobra e come um espetinho de rã… Mas o que eu quero mostrar é que, em sustentabilidade, o que menos as pessoas têm são respostas certas. Eu incluída.
Sustentabilidade não é um assunto novo, existem livros da década de oitenta que já alertavam sobre Aquecimento Global, o que é novo é o interesse das pessoas sobre esse assunto. Mas sabe o que é mais antigo do que as pirâmides do Egito? Sociedades que, diferentes da nossa, aprenderam a viver em perfeita conexão e harmonia com a natureza na qual estavam inseridas.
Então a minha única dica de sustentabilidade hoje é a seguinte: o mais importante é o amor e o cuidado. E a disposição. E a atitude. Se eu te passar uma lista de coisas que você deve fazer ou deixar de fazer para cuidar da natureza, você pode até decorar, mas se você não ver sentido naquilo vai deixar de fazer na segunda semana (exatamente como eu tentando aprender logaritmo na escola, “O que é isso? Pra que serve?” Esquecia tudo no minuto seguinte que saia da classe).
O mais importante é você se envolver, gostar, ver sentido naquilo, e aí sim, ir atrás de respostas e dicas de corpo e alma abertos. Qual sua relação com a natureza e os animais? Por que você acha que não devemos desmatar a Amazônia: por que se não nós vamos nos prejudicar pela falta de água e oxigênio, ou por que isso vai prejudicar, além de nós, milhões de espécies de animais e plantas que dividem o planeta conosco, sem falar nas populações que vivem lá há milhares de anos antes da gente?
Você está disposto a pagar mais caro por um alimento orgânico porque ele não faz mal pra sua saúde, ou porque, além de não te fazer mal, ele não polui os rios, não mata as abelhas e é mais seguro para o agricultor que está trabalhando lá no campo? Tanto faz quais as suas respostas, mas a reflexão é importante. Antes de ir atrás das “regras” da sustentabilidade, percorra o caminho de achar o sentido dela!
Talvez praticar a sustentabilidade seja muito mais uma questão de sensibilidade do que de razão.