Ração de carne não é feita com carne no Brasil, revela estudo da USP
A indústria de ração para cães e gatos do Brasil pode estar nos fazendo comprar gato por lebre – é o que demonstra um estudo da USP publicado no periódico Peerj.
A pesquisa, coordenada pelo engenheiro agrônomo Luiz Antônio Martinelli, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena), vinculado à USP, analisou 82 amostras de ração para cães, de 25 marcas diferentes; e 52 amostras de ração para gatos, de 28 marcas.
Os resultados demonstram que os fabricantes não têm sido honestos com a rotulagem dos produtos, seja com a ausência de nutrientes mencionados na embalagem ou adotando estratégias de marketing que levem o consumidor a comprar um produto que não é exatamente o que esperava.
Resultados das rações caninas analisadas
O estudo avaliou rações secas e úmidas. Em média, 60% dos nutrientes são de origem animal e 40% de origem vegetal, como milho. Nenhuma das embalagens, entretanto, fazia qualquer menção à presença do grão ou de vísceras (restos) de frango em grandes proporções – itens encontrados em abundância pelos pesquisadores.
A maior parte dos produtos, cerca de 80%, apresenta ilustração de suculentos pedaços de carne, o que não condiz com a realidade, segundo o coordenador da pesquisa:
“A embalagem mostra uma coisa, induzindo o consumidor a pensar na ‘nobreza’ dos ingredientes, mas, na verdade, quase tudo se reduz a milho e frango”, destacou Martinelli.
Resultados das rações felinas analisadas
As amostras de ração para gatos apresentaram resultado mais preocupantes, conforme os pesquisadores. Dois terços dos produtos têm mais ingredientes de origem vegetal do que o ideal.
Até nas rações úmidas, onde o rótulo traz apelo de “presença de carne” ou “presença de peixe”, apenas 25% do conteúdo era, de fato, de origem animal. Em análise da pesquisa, a bióloga Janaina Leite, mestranda do Cena, explicou porque a presença de mais vegetais (ricos em carboidratos) é preocupante:
“O gato é um carnívoro restrito, com menor capacidade para digerir carboidratos. Por isso, alguns autores recomendam que sua dieta seja composta de, no máximo, 10% desse ingrediente”, explicou.
Como escolher a melhor ração, então?
Com informações mascaradas na embalagem ou não, é certo que a venda de alimentos para animais domésticos vai continuar em alta. O Brasil conta com o segundo maior mercado do gênero no mundo, segundo essa mesma pesquisa. Mas como garantir que estamos escolhendo o melhor para nossos animaizinhos?
Leonardo de Aro Galera, um dos pesquisadores à frente do estudo, orienta que o consumidor leia sempre o rótulo com atenção (vale destacar que os ingredientes que aparecem primeiro na lista estão presentes em maior quantidade).
Segundo Galera, caso algum subproduto desconhecido seja mencionado, o consumidor deve entrar em contato com o SAC do fabricante e questionar.
“Outra dica que eu dou, para quem tem gato, é que, quanto mais úmida a ração, como aqueles sachês de comida, maior é o nível de proteína. O problema é que geralmente elas são mais caras, mas costumam ter mais qualidade”, afirma o pesquisador.
Apesar de confundir os consumidores, não há consenso se as práticas adotadas configuram ilegalidade. Uma instrução normativa do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento exige apenas especificação qualitativa dos produtos, não quantitativa; mas afirma também que as informações do rótulo não devem induzir o consumidor a “equívoco, erro, confusão, falso entendimento ou engano, mesmo por omissão“.
Como as marcas testadas não foram especificadas na pesquisa, o jeito é seguir as dicas e ficar de olho nos rótulos mesmo.