Tem gente que gosta de Carnaval. Gosta muito. É capaz de passar o ano ensaiando numa Escola de Samba para desfilar no sambódromo às cinco da madrugada, carregando um costeiro de 20 quilos com uma espécie plástica de árvore amazônica pendurada nele.
Já outros, aproveitam os feriados para enfrentar um trânsito de nove horas e chegar no que se pode chamar de paraíso do inferno — uma faixa de areia suja, ocupada por uma população bebélica, desfilando seus excessos adiposos em exíguos maiôs.
Para esses dois tipos, desejamos ótimo Carnaval.
Mas e para nós, preguiçosos convictos, incapazes de mostrar qualquer reação positiva ao som de uma batucada… o que nos resta?
Resta muito. Contanto que não dê trabalho, não exija esforço nem físico nem mental, o universo carnavalesco é pleno de opções.
Não, não estou falando em ir a um show de jazz, participar de um bloco de rua, ir ao estádio ver um jogo de tênis, pegar uma piscina ou ficar transando com a namorada. São atividades que dão trabalho. Reservadas a pessoas que não sabem usufruir o doce prazer da preguiça em seu estado mais puro.
Preguiçosos carnavalescos, uni-vos!
Em primeiro lugar, lembre-se que a expressão máxima da preguiça é o sono. Então, por que não fazer como os gatos? Durma 17 horas por dia em cada um dos dias do Carnaval. Assim: janelas fechadas, televisão fora da tomada, computador coberto por uma toalha.
Acordou e está aborrecido? Tente um cinema. Nem precisa escolher o filme — o importante é um bom ar condicionado e uma poltrona confortável e espaçosa. Quem sabe você não tira uma soneca?
Evite sair de casa. A dica é ir às compras na véspera e fazer um estoque de rato. E não esqueça o papel higiênico. Comidas práticas, congeladas ou cruas. Nada de inventar de fazer uma lasanha ou um bacalhau — pratos que atentam contra a moralidade dos preguiçosos.
Se for para encontrar amigos, seja seletivo. Tem gente que pega fogo no carnaval: ainda que não curta um samba, parece tomada pelo espírito inquieto de “fazer coisas”. Visite aqueles que topam tomar uma cerveja de pernas para o ar e, se possível, em silêncio. Falar cansa, ainda mais se for para elaborar algum tipo de raciocínio — como, por exemplo, explicar que você não quer saber de carnaval, escola de samba, mulata e pandeiro.
Recuse incisivamente qualquer convite “bem disposto”. Ir a um parque, por exemplo, é roubada — quando você menos espera, está na pista de corrida tentando bater o seu recorde histórico. Não há nada pior para preguiçosos do Carnaval.
Muito melhor do que isso é tomar um longo banho de banheira, ver um clássico do cinema, desses com quatro horas de duração, ouvir um som em estado de catatonia, comer um pacote de bolachas assistindo “Padrinho Mágicos” na TV, mamar sem culpa uma lata de leite condensado e jogar um game com 68 níveis. E para fechar com chave de ouro, recomendo a leitura de “O Direito à Preguiça”, obra de Paul Lafargue, escrita em 1880 e cujas ideias, infelizmente, não ultrapassaram a teoria.
Eu daria mais algumas sugestões, se não estivesse morrendo de preguiça. Afinal, o Carnaval está aí e o espírito do Momo já está me contagiando.
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