Jardim de chuva (rain garden) ou canteiro drenante é um sistema que atua na retenção, infiltração e no tratamento de águas pluviais, impedindo a ocorrência de alagamentos nas grandes cidades e com outros benefícios. Conheça agora!
Na primeira vez que ouvi essa expressão, imaginei várias cachoeiras no lugar de plantas em jardins. Mas a proposta desses jardins está mais dentro da realidade de ser executada em grandes centros do que a minha imaginação.
Melhorar o microclima nas chamadas “selvas de pedras”, minimizar os alagamentos e promover a manutenção de áreas verdes são algumas das vantagens dessa técnica.
Jardim de chuva (rain garden) ou canteiro drenante é um sistema que atua na retenção, infiltração e no tratamento de águas pluviais proveniente de superfícies impermeáveis, ou apenas, uma técnica que ajuda na infiltração de água no solo, impedindo a ocorrência daqueles alagamentos históricos das grandes cidades.
Quando alguém observou a chuva
Zephaniah Phiri Maseko morava no Zimbábue. Desempregado e com uma família extensa, procurava maneiras para se sustentar.
Até que um dia, ao observar como a água da chuva corria por sua pequena área, Maseko percebeu que com as ferramentas certas e com a vontade que tinha, poderia captar e direcionar o caminho das águas, a fim de aproveitá-la no terreno.
Caminho de pedras por onde a água flui após o reservatório de água chega ao seu limite.
Controlando a velocidade da água com pedras e plantas nativas, Maseko conseguiu um milagre: produzir alimentos durante todo o ano em pleno continente africano.
Toda comunidade aderiu a ideia e perceberam que com um pouco de dedicação, seu esforço era recompensado com alimentos frescos, saudáveis e com áreas verdes em plena estação seca.
Maseko colhendo repolho (à esquerda) e cenouras (à direita).
A técnica não só permitiu a produção de alimentos como contribuiu para fortalecer interrelações entre diferentes indivíduos.
Ao ensinar o seu povo sobre segurança alimentar, Maseko promoveu a diminuição da violência na sua comunidade. Atitudes assim devem ser incentivadas e divulgadas por vários lugares.
Um lugar para chamar de nosso
Brad Lancaster, morador estadunidense da cidade de Tucson, dirigiu-se até o Zimbábue para conhecer de perto os feitos de Maseko. Empolgado com a ideia e preocupado em resolver os constantes alagamentos que aconteciam em seu bairro, Lancaster transformou a paisagem do terreno de sua casa.
Rua, em Tucson, onde morava Brad Lancaster antes (à esquerda) e após (à direita) o jardim de chuva.
Ao observar como as inundações começavam, ele identificou e cavou valas nos locais onde as águas se acumulavam. As águas provenientes de chuveiro, pias e lavanderias também começaram a ser direcionadas para os jardins.
Com essa técnica, Lancaster deu ao lugar “ilhas” livres de calor, reduzindo a sensação térmica em até 6ºC. E olha que ele mora numa cidade situada em pleno Deserto de Sonora, no estado do Arizona!
Também observou uma grande economia no uso da água. Nos EUA, cerca de 30 a 50% das famílias utilizam água para irrigar os jardins. Com os jardins de chuva, o consumo desse bem precioso caiu pela metade.
Os moradores de Tucson gostaram da proposta e fizeram em suas casas e terrenos. Ao cultivar plantas nativas nesses locais, obtiveram frutas à vontade e um lugar bonito de viver. Esse movimento acabou criando políticas públicas específicas para a construção de jardins de chuva em toda a cidade de Tucson.
Os jardins de chuva trouxeram mais vida ao local. Com a presença das áreas verdes, os moradores saíram das casas, movimentando e fornecendo maior segurança aos bairros. O verde trouxe a presença de pássaros, sombra e água estocada em profundidade para as raízes.
Meio-fio na rua em frente à casa de Brad Lancaster em Tucson, Arizona, escoamento direto da água da rua.
Arquitetura do jardim de chuva
A ideia deu tão certo que, além de Tucson, a técnica passou a ser utilizada em cidades como Nova York, Seattle, Kyoto, Londres, e até mesmo em São Paulo e Rio de Janeiro.
Rua Alma em Londres/EN antes (à esquerda) e depois (à direita) da construção dos jardins de chuva.
Na arquitetura, os jardins de chuva são conhecidos como sistema de biorretenção, projetados e construídos em pontos estratégicos de grandes cidades. Os jardins são construídos na parte mais baixa do terreno para onde a água será levada.
Uma mistura contendo solo, areia e cascalho é colocada em várias camadas (layers). Estes representam a base, que deve ser porosa e favorecer a infiltração, onde será plantada a vegetação a fim de favorecer para o desenvolvimento das plantas.
Estrutura básica de um jardim de chuva
Existem diferentes versões de montagem de um jardim de chuva. A ideia é que tenham várias camadas drenantes.
No fundo pode ter brita, depois areia, solo e o substrato para o desenvolvimento das plantas. Exista ainda quem opte pela colocação de galhos, tocos e podas de árvores. Como esses materiais estão em decomposição, eles auxiliam na infiltração da água no solo.
Vale dizer que é importante, também, colocar cada espécie de planta no seu devido nível. Algumas espécies gostam de muita água, outras menos e tem aquelas que gostam de pouquíssima água. Todas podem e devem ser contempladas no jardim de chuva.
Topo | Terraço | Fundo (maior necessidade/tolerância de água) | Terraço (menos necessidade/tolerância de água) | Topo (a menor necessidade/tolerância de água)
Jardins de chuva no Brasil
São Paulo foi uma das primeiras cidades a adotarem a ideia. Em 2016, o bairro Vila Jataí recebeu os primeiros jardins de chuva feito em parceria com a subprefeitura. Depois foi a vez do Largo das Araucárias, no bairro Pinheiros. A primeira praça pública a ter um jardim de chuva em São Paulo.
E assim, foram surgindo em outras regiões: rua Fiandeira, na Zona Sul; distrito da Sé, Liberdade, Bela Vista, Bom Retiro e outros. No Pacaembu, a Rua Major Natanael tem o maior sistema de jardim de chuva do Brasil, com mais de 2700 m² de área verde.
Jardins de chuva instalados em São Paulo e Rio de Janeiro. Superior à esquerda: Largo da Araucária (SP), superior à direita: Vila Jataí (SP), inferior à esquerda: Rua Major Natanael (SP), inferior à direita: Arcos da Lapa (RJ)
No Rio de Janeiro, Arcos da Lapa foi uma das primeiras regiões beneficiadas. Antes, a frequência dos alagamentos dificultava a realização de eventos. Com a construção do jardim, o problema foi resolvido de maneira simples e com baixo investimento.
Em Copacabana a iniciativa partiu de moradores locais preocupados em melhorar o ambiente local e mitigar as chuvas torrenciais que atingem a região. A Fundação de Parques e Jardins (FPJ) permitiu que os moradores adotassem o canteiro com a condição de mantê-lo limpo e conservado.
Jardim de chuva em Copacabana
Confira alguns benefícios de um jardim de chuva:
- Diminuição de enchentes e alagamentos em regiões com histórico;
- Melhora na qualidade do ar;
- Permite a criação de zonas livres de calor dentro da cidade;
- Criação de locais para plantios de árvores nativas, frutíferas, flores e até hortaliças (produção de alimentos para quem precisa comer);
- Atrai pássaros, borboletas e outros insetos benéficos, como libélulas, que consomem mosquitos;
- Reduz o número de poluentes que fluem de áreas urbanas direto para os cursos de água;
- Contribui para maior interação entre moradores da região (mais pessoas na rua tendem a diminuir a criminalidade).
Todos concordamos que ter a natureza por perto nos dá uma sensação de bem estar e prazer, não é verdade? E por que não trazer isso para o nosso cotidiano?
Você pode entrar em contato com interessados na sua região e fazer um pedido junto a prefeitura da sua cidade. Ajude a deixar a sua cidade mais bela, harmônica e sustentável!
“Seja a mudança que você quer ver no mundo” – Mahatma Gandhi.