Isolamento social: como aguentar mais uns meses e não desistir
Para muitos, essa nova rotina se tornou bastante desgastante. Sem fuga de relaxamento, o que fazer para aguentar firme e continuar seguindo a quarentena? Pesquisadores ensinam algumas práticas simples, como cantar e respirar, que podem ajudar a não desistir do isolamento social. Leia a seguir.
O conteúdo desse artigo usa como referência o terceiro episódio da minissérie documental produzida e exibida pela Netflix: “Explicando… o coronavírus“.
Contextualizando:
Para alguns, a vida já parece voltar ao normal. Vários estados brasileiros já flexibilizaram as medidas preventivas tomadas ao longo dos últimos meses, e consequentemente a taxa de isolamento no país caiu, como mostram os dados do Índice de Isolamento Social desenvolvido pela Inloco.
Em março, mês onde os casos de coronavírus começaram a crescer no Brasil, a taxa de isolamento chegou à 62,2%. No final de julho, quando a pandemia ultrapassou 90 mil mortes, esse número caiu para 39,9%.
Pessoas voltam à viver suas vidas “normalmente”, andando pela ruas e até mesmo se reunindo em festas, enquanto a situação ainda é bastante preocupante. O Brasil é o segundo segundo país com mais mortes por Covid-19 no mundo, atrás apenas dos EUA.
Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), atualizados na publicação desse artigo, ao redor do mundo já são mais de 16 milhões de infectados e e o número de mortes já ultrapassa os 600 mil.
Por aqui, apesar do comportamento instável do coronavírus, com registros diários que hora são altos e em outras menores, a curva de infectados continua crescendo, como mostra gráfico do Ministério da Saúde.
Apesar de vacinas já estarem em fase de testes avançados, o distanciamento social continua sendo a única arma que temos em mãos para frear a taxa de contaminação pelo vírus. E é por isso que muitas pessoas ainda continuam seguindo em isolamento social, mesmo que isso seja difícil.
O medo que salva, também estressa
De acordo com o psicólogo Ali Mattu, ao “Explicando – Coronavírus”, em um momento como esse, onde uma pandemia se instalou em diversos países do mundo, com um vírus ainda desconhecido e invisível, nós precisamos sentir medo pois ele “nos ajuda a sobreviver, a nos preparar para o perigo”.
Esse sentimento fez com que muitas pessoas seguissem as medidas de segurança como uso de máscaras, higienização contínua e sair somente quando necessário, afinal, quem queria correr o risco de ser contaminada ou de contribuir na propagação da Covid-19?
Mas é preciso ter cuidado com o medo acumulado que a pandemia e o isolamento social podem causar, pois, ainda que ele seja bom para nos fazer seguir regras e sobreviver, o sentimento também pode gerar estresse, ansiedade e outros transtornos.
Levantamentos da Research Center mostraram que, nos primeiros meses da pandemia nos Estados Unidos, um terço da população adulta apresentou transtornos psicológicos intensos.
O quadro ainda pode se agravar mais, quando somos submetidos à uma alta carga de estresse, prolongada, provocando o que a psicologia chama de Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT), que pode durar semanas, meses e até mesmo anos, afetado diretamente no surgimento de outras comorbidades em sua vida.
Corpos e mentes não foram feitos para estresse crônico
Quando estamos em perigo ou com medo, seja ele físico ou emocional, como agora na pandemia por coronavírus, uma parte do nosso sistema nervoso autônomo chamado simpático, prepara nosso organismo para reagir, através de estímulos que vão do cérebro para o resto do corpo.
Em situações perigosas, de alerta, o estresse serve como uma forma de nos deixar “ligados” e prontos para lutar contra aquilo, ou fugir.
Ao entrar em ação, o sistema simpático libera adrenalina e cortisol, os hormônios do estresse; e o fígado aumenta a taxa açúcar no sangue, causando uma explosão de energia.
Os sinais mais claros dessa reação podem ser vistos e sentidos quando:
- nossas pupilas dilatam,
- a frequência cardíaca aumenta
- e nossa respiração fica mais ofegante.
De acordo com o neurocientistas Daniel Levitin, à série documental da Netflix, corpos e mentes não foram feitos para estresse crônico, e sim para estresses de curto prazo, pois, “a adrenalina e as outras substâncias liberadas se exaustam com a luta ou com a fuga”.
Isso significa que, ao resolver alguma situação estressante, ou buscar meios de fugir daquilo, o corpo volta ao seu equilíbrio natural, e a segunda parte do sistema nervoso autônomo, o parassimpático, entra em ação, dizendo que está tudo bem e que podemos ficar calmos.
Mas sem a possibilidade de lutar contra o vírus e sem conseguir outras fugas, por conta da quarentena, esse estresse se acumula, e isso pode nos causar problemas que vão desde dificuldades para dormir, dores de cabeça e má alimentação, e até mesmo quadros causados pelos estresse, como o próprio Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT).
Coping: mecanismos de enfrentamento
Já sabemos todo o estresse que o isolamento pode nos causar, mas como evitar que ele se acumule a cada dia, junto com a incerteza, angústia, tédio, saco cheio, vontade de socar a parede, de pular da j e ansiedade de voltar para a vida normal, estando em isolamento social, sem ter suas fugas de relaxamento?
Gastar energia correndo no parque; abrir uma cerveja gelada depois de um dia daqueles no trabalho; conversar sobre um problema que aconteceu com um amigo; sentar na mesa do bar depois de um término.
Sem isso, o que sobra? O coping, que traduzido da psicologia significa encontrar maneiras de enfrentar ou se adaptar à situações de desafio ou ameaças.
Pequenos cuidados que ainda podemos ter e que ajudam a equilibrar o nível de estresse do corpo, contribuindo a suportar um poucos mais o isolamento social, e prevenindo de males futuros que o acumulo de estresse pode causar.
Existem algumas técnicas bem simples. Veja a seguir.
1. Inspire, respire e não pire
Quando respiramos fundo, de forma controlada e calma, mesmo em meio à situações estressantes, o nosso corpo acaba ficando mais calmo.
Ao estar submetido ao estresse, nossa variabilidade de frequência cardíaca (VFC) – ou a variação em que nossos batimentos cardíacos acontecem – se torna mais acelerada e irregular.
Mas ao respirarmos fundo, é como enganar nosso cérebro, diminuindo os efeitos do estresse. Dizendo para o corpo e, principalmente, para o lado do sistema nervoso autônomo responsável por frear essas substâncias estimulantes do estresse, que tá tudo bem.
Que tal tentar o velho ditado “Respira fundo…”?
Inspire o ar pelo nariz durante cinco segundos e em seguida expire, pela boca, durante a mesma quantidade de tempo.
O SOS já publicou diversas técnicas de relaxamento, utilizando apenas a respiração:
-
3 Técnicas de respiração: para aliviar o estresse, energizante e coerente;
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Respiração 4-7-8:
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O truque mais simples para meditar (respire!);
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Mindfulness (técnica da respiração):
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Exercícios para fortalecer os pulmões.
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Respiração 4-7-8 para combater a insônia:
2. Notícias, sim. Mas apenas uma vez ao dia
Se manter informado e dar valor a notícias verdadeiras é algo extremamente importante no contexto em que vivemos atualmente. Porém, consumir conteúdos relacionados em demasia pode aumentar o estresse, colocando o isolamento social em risco.
Como exemplo, um estudo publicado no New England Journal of Medice, revelou índice alto de estresse em estadunidenses que leram mais jornais e assistiram o noticiário da TV durante o atentado de 11 de setembro, do que aqueles que consumiram menos esse tipo de conteúdo.
A psicoterapeuta, Lori Gottlieb, em entrevista ao “Explicando… o coronavírus”, diz que vê notícias apenas uma vez ao dia, pois sabe que, “nada que eu ler durante o dia mudará meu comportamento. Isso não me beneficiará”. E isso acaba facilitando a aceitação sobre a incerteza do que vivemos.
3. Construa uma rotina com coisas que te fazem bem
O mundo lá fora ainda é meio imprevisível, e isso muitas vezes pode assustar. Mas ao criar uma rotina, conseguimos trazer para nossa vida uma certa previsibilidade, mesmo em meio à tantas incertezas.
Ter algo para fazer, que não seja estar ansioso para saber se os testes de vacinas vão dar certo ou estar estressado por conta do isolamento, ajuda a manter a calma. Descubra o que é melhor para você e não fique parado, sem fazer nada. Mesmo dentro de casa, procure se ocupar e ter responsabilidades.
Uma dica simples e sem erro é ter um momento para curtir seus filmes favoritos, eles ajudam a relaxar:
4. Pratique a solidariedade
Já sentiu aquela sensação de se sentir melhor depois de ajudar alguém? É isso que acontece como praticamos a solidariedade, pois nosso cérebro acaba diminuindo os níveis de cortisol e, consequentemente o estresse.
É um sentimento que faz bem para nosso corpo, como mostra uma pesquisa publicada pelo Journal of Health Psychology, que mostra que a ajuda ao próximo contribui mais à longevidade do que exercícios quatro vezes por semana.
No quadro abaixo, veja que fazer um ato de generosidade libera ocitocina (oxitocinona). Esse é o hormônio regula as emoções e o humor, favorecendo à diminuição do estresse.
5. Lembre-se que isso não é só sobre você
Em uma pandemia mundial, não é só a gente que está passando por desafios.
Mesmo que o estresse pelo isolamento social cause muitas vezes, as pessoas que permanecem cumprindo as recomendações de segurança também têm dificuldades para lidarem com tudo isso, além de quem foi infectado pelo vírus e vive dias piores em leitos de hospitais.
Desviar o foco de si mesmo e entender que este é um problema sem soluções individuais, pode ser uma das formas de encarar o isolamento com mais facilidade. Um dos pontos chaves para manter as pessoas em casa é entender que, para solucionar tudo isso, a ajuda de todos é fundamental.
Perceber que outras pessoas também estão fazendo o mesmo ajuda, afinal, enfrentar situações de medo com companhia é bem mais fácil do que sozinho.
6. Busque ajuda profissional
Quando perceber que a coisa já está saindo de controle, não evite procurar a ajuda de profissionais, principalmente os da área de saúde mental.
O SOS já divulgou iniciativas de psicólogos e projetos que estão realizando atendimento gratuito, de forma online, durante a quarentena. Veja todos os detalhes aqui.
7. Quem canta, os males espanta!
Segundo o neurocientista Daniel Levitin, também ao documentário da Netflix, a música possui alguns elementos que reduzem o estresse, e mesmo que não se saiba ao certo o que faz isso acontecer, a ocitocina, responsável por nos dar a sensação de vínculo, também é liberada nessa atividade.
Vale dizer que, segundo a Oxford, cantar libera endorfina, hormônio responsável pelo prazer e também pela redução do estresse.
Na Itália, por exemplo, pessoas comuns viraram notícia depois que vídeos de moradores reunidos nas janelas de suas casas para cantar em coro viralizaram na internet como forma de enfrentamento a quarentena.
Mas como fazer isso com pessoas que não estão ao alcance de nossas janelas e portas?
Segundo recomendações da Organização Mundial de Saúde, utilizar a internet e as redes sociais como forma de nos manter conectados a outras pessoas, principalmente as mais queridas, pode ajudar a enfrentar o isolamento social.
Que tal reunir as pessoas do seu coração em uma vídeo chamada para cantar, em grupo, algumas músicas? Olha, vale até cantar sozinho:
8. Espalhe histórias positivas
E se, ao invés de focar em notícias negativas, você passasse a consumir mais histórias positivas relacionadas ao coronavírus e compartilhá-las?
Ler e assistir noticias de superação e números de pessoas recuperadas do novo coronavírus, pode ser mais interessante do que todos os dados negativos – que são muito importantes, mas acabam trazendo desesperança e incerteza sobre o futuro -, e podem dar um ânimo para você e outras pessoas em saber que, apesar de difícil, essa situação pode e vai ser superada.
Uma técnica simples para praticar a positividade em meio ao caos, é lembrar-se de 3 coisas as quais é grato, todos os dias. Pode ser qualquer coisa:
- “ter comida no prato”,
- “cama para dormir”,
- “teto para me proteger”,
- “Sol para me banhar”,
- “água para beber”…
– Vale dizer que fazer isolamento social sem apoio financeiro do Estado ou da empresa que trabalha é ainda mais desafiador, portanto essas dicas valem principalmente para você que PODE ficar em casa.
Netflix, World Health, World Health (2), Mapa Brasileiro da Covid, Covid Saúde, Stoodi, G1, Psicologia.pt, Pew Research Center, Atlas da Saúde, Pfizer, Scielo, Blog Saúde, Journal of Health Psycology, Drauzio Varella(2). https://drauziovarella.uol.com.br/coronavirus/tecnicas-de-respiracao-para-aliviar-a-ansiedade/, NEJM, Almanaque SOSO, Folha