Traumas: entenda como a infância modifica o cérebro adulto
Ao falar sobre o abuso que cometeu contra Lucas Penteado no programa BBB21, a cantora Karol Conká revelou que o participante a lembrava de traumas com o pai. O que faz sentido, se levar em conta a conclusão de um novo estudo sobre o tema.
Muitos pais, seja pela perda de controle e paciência ou simplesmente porque aprenderam que é preciso bater nos filhos para educá-los, adotam algum tipo de agressão para ajudar na disciplina dos pequenos.
Não são raras as crianças que já levaram um puxão de orelha, algumas palmadas ou um beliscão, isso quando as agressões não são mais intensas. Aliás, houve tempos em que até mesmo os especialistas em educação infantil recomendavam castigos físicos como ferramenta para a disciplina das crianças.
A fala da cantora Jaque Karol Conká em entrevista ao programa Mais Você, Rede Globo, nos alerta sobre as consequências de tais atos. A artista revelou que um trauma da infância pode ter sido responsável por engatilhar um comportamento violento no Big Brother Brasil:
“Com o Lucas, eu lembrava de momentos com o meu pai. Ele não tem nada a ver com isso, mas eu lembrava. Isso não justifica nada, são coisas que eu estou descobrindo que não sei lidar. (…) Se eu soubesse disso, não teria nem entrado, teria ido me tratar”, afirmou a participante do BBB21.
E de fato, é cada vez maior a quantidade de estudos demonstrando que agressões (físicas, verbais ou comportamentais) podem prejudicar o desenvolvimento das crianças muito mais do que a maioria das pessoas imagina.
Recentemente, um novo estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Alberta (Canadá), demonstrou que as estruturas cerebrais dos adultos poderiam passar por pequenas mudanças em decorrência de situações estressantes ou traumáticas ocorridas décadas antes, durante a infância.
Apesar de muitos estudos já terem sido realizados, esse foi o primeiro a demonstrar que maus-tratos e traumas ocorridos nos primeiros anos de vida da criança podem, sim, causar alterações em regiões pontuais do hipocampo e da amígdala.
Vale lembrar que esses eventos traumáticos ocorridos durante a infância constituem um fator de risco para a condição chamada de Transtorno Depressivo Maior, que surge na idade adulta.
O estudo
De acordo com os pesquisadores, ao ocorrerem mudanças nas áreas cerebrais citadas, o cérebro não funcionaria de forma adequada. Com isso, haveria um potencial aumento do risco de a pessoa desenvolver algum tipo de transtorno mental durante a idade adulta, especialmente em períodos de grande estresse.
Uma vez que as alterações ocorrem em áreas ligadas ao estresse, essas regiões podem perder a capacidade de adaptação ou podem passar a funcionar de maneira disfuncional quando a pessoa, já adulta, precisa lidar com esse tipo de pressão.
É por isso que elas ficam mais vulneráveis e susceptíveis ao desenvolvimento de problemas mentais e emocionais, como distúrbios psiquiátricos e a própria depressão.
Para Peter Silverstone, responsável pelo Departamento de Psiquiatria da Alberta, com a possibilidade real de identificar as sub-regiões do hipocampo e da amígdala que foram permanentemente alteradas devido aos abusos, maus-tratos e traumas na infância, será possível dar início a pesquisas mais detalhadas sobre a possibilidade de minimizar os efeitos negativos e, quem sabe, até revertê-los.
Ainda segundo o estudo, a amígdala e o hipocampo são considerados como pontos sensíveis devido ao desenvolvimento prolongado no pós-natal.
Os pesquisadores também chamam a atenção para as perspectivas abertas por esse estudo, especialmente, devido ao fato de que muito do trabalho observado sobre os efeitos de traumas nas subestruturas do hipocampo e na amígdala, até então, foram realizados em animais não-humanos.
Para o levantamento dos dados foi selecionado um grupo foi composto por 35 participantes com Transtorno Depressivo Maior (homens e mulheres), além de outro grupo com 35 participantes saudáveis para controle.
Como educar os filhos sem agressões
Mas como educar os filhos sem agredir? Existem algumas práticas simples que são muito funcionais para lidar com a criança, discipliná-la e ensiná-la sem que seja preciso algum tipo de agressão. Veja alguns exemplos:
Tirar privilégios
O objetivo é ensinar que a cada escolha ruim, uma consequência negativa pode surgir. É importante que a perda esteja ligada ao comportamento da criança, além disso, é essencial deixar claro que os privilégios podem ser recuperados se a situação mudar. Geralmente, 24 horas já é tempo o suficiente para que a criança reflita melhor sobre suas escolhas.
Ignorar o comportamento (de maneira estratégica)
Não significa virar a cara para o lado ou fingir que não está vendo. A questão, é que muitas crianças se comportam mal apenas para obter atenção dos pais. Por exemplo, se seu filho fizer birra ou ficar reclamando para chamar sua atenção, não dê isso a ele. Finja que não está ouvindo. Porém, quando ele pedir com calma e gentileza, responda com atenção. Com o tempo, ele aprenderá que, ao ser educado, suas necessidades podem ser atendidas mais facilmente.
Consequências naturais
A ideia é permitir que a criança aprenda com seu próprio erro. Por exemplo, se ela não quis usar a blusa de manga comprida para se proteger do frio, deixa-a sair e experimentar um pouco do frio (desde que seja seguro). Se comeu todo o doce da sobremesa fora de hora, deixe a criança sem o doce após o jantar.
Não se esqueça de monitorar a situação para que seu filho não corra algum perigo real, por exemplo, ficar muito tempo no vento frio e acabar resfriado.
Recompensas (*use em último caso)
Esse é o método menos indicado e mais polêmico, porém, ainda é melhor do que a violência. As recompensas pelo bom comportamento ajudam a mostrar para a criança que suas ações positivas podem ser ainda mais vantajosas para ela. O sistema de recompensas também ajuda a estabelecer novas direções. Por exemplo, se a criança briga muito com os irmãos, criar algum tipo de recompensa pode ajudar a fazer com que ela se esforce mais para evitar confusões.
Por fim, é bom lembrar que nem tudo podemos resolver sozinhos. Existem muitas situações em que o mau comportamento da criança tem origem em problemas mais profundos, como a separação dos pais, o bullying na escola ou até mesmo algum transtorno mental.
Sendo assim, se perceber que seu filho age de forma muito diferente das crianças de sua idade, procure identificar a causa e um especialista na área. Por exemplo, se o mau comportamento surgiu depois da separação, um psicólogo poderá ajudar a criança a lidar com a situação.
E a dica final para todos os adultos traumatizados desse mundão: faça terapia!