Você bebe igual um condenado quando é jovem. Vomitar e dar “PT” são palavras que estão no vocabulário de muitas pessoas nessa faixa etária. Mas conforme o tempo passa, suas ressacas ficam cada vez piores e você acorda no dia seguinte sem sequer conseguir levantar o dedo mindinho. Isso é normal e tem explicação.
O que o álcool faz com nosso corpo
Primeiro, vamos entender o mecanismo de funcionamento do álcool no organismo. Ao contrário do que possa se pensar, a bebida alcoólica é uma substância que deprime o sistema nervoso central (SNC). Ela age em diversos órgãos, como o fígado, o coração, vasos sanguíneos e na parede do estômago.
“Quando a pessoa bebe, no início, ela tem uma sensação de euforia e relaxamento, fica mais falante, mais sociável e perde até um pouco a crítica, ficando mais desinibida”, explica Themis Mizerkowski Torres, médica especialista em toxicologia e coordenadora do Núcleo de Prevenção e Controle de Intoxicações da Prefeitura de São Paulo.
Mas o consumo em altas doses, segundo a especialista, pode acarretar em diversos problemas, como perda de coordenação, sonolência e até levar ao coma, denominado de coma alcoólico. Cirrose hepática, cardiomiopatia dilatada (aumento do coração), hipertensão arterial e arritmias são outros problemas que o abuso da bebida pode causar.
O que são concentrações elevadíssimas de álcool?
Segundo a Dra. Erica Siu, especialista em dependência química e coordenadora do CISA (Centro de Informações sobre Saúde e Álcool), é a partir de 0,35 gramas/100 mililitros de álcool. Nesse caso, o indivíduo pode entrar até em coma ou morrer.
Os efeitos da substância no organismo dependem de diversos fatores individuais e genéticos, além do comportamento em relação à bebida, como volume de álcool consumido ao longo do tempo, padrões de consumo, motivações para o uso e contextos relacionados à ingestão de bebidas alcoólicas.
Falamos mais sobre o assunto nesse artigo, mas segundo Siu, a matéria é baseada em unidades de álcool no Reino Unido, colocando a equivalência de 1 taça de vinho a 3 shots de destilado.
“No Brasil não temos uma diretriz, por isso adotamos as orientações da Organização Mundial da Saúde. Reforçamos que a dose padrão é de cerca de 14 gramas de álcool puro, o que corresponde a 350 ml de cerveja 5% (1 latinha), 150 ml de vinho com teor alcoólico de 12%, ou 45 ml de destilado com 40% de teor.
Comparação de dose padrão de acordo com diferentes instituições.
Mas onde fica a ressaca em tudo isso?
A ressaca nada mais é do que o resultado de uma intoxicação aguda de álcool, que começa seis a oito horas depois da bebedeira.
“Os sintomas da ressaca parecem ser causados por uma combinação de desidratação, alterações hormonais, alterações inflamatórias e efeitos tóxicos diretos do álcool.
(…) Ele também agride a parede do estômago, provocando enjoos e vômitos, além de causar desidratação, por diminuir a ação do hormônio anti-diurético (por isso vamos tanto no banheiro para urinar)”, explica a médica especialista em toxicologia.
O fenômeno da ressaca ainda não é totalmente compreendido cientificamente, mas diversos mecanismos demonstram contribuir para seu desenvolvimento.
“Existem evidências de que o álcool poderia produzir os efeitos indesejáveis diretamente, ao atuar sobre os rins na produção de urina, no trato gastrointestinal, nas concentrações de açúcar no sangue e no padrão de sono e ritmo biológico. Ainda, outras evidências apontam para o papel do acúmulo dos componentes químicos derivados da metabolização do álcool na produção dos sintomas.”, conclui Siu.
De forma geral, o álcool aumenta a concentração de algumas substâncias inflamatórias. De acordo com uma matéria publicada pela Vice, alguns desses mediadores inflamatórios são prostaglandina E2 e tromboxano B2, além da bebida inibir a produção de glutamina, que atua como nutriente (energético) para as células imunológicas, o que faz com que você fique bem podre de cansado no dia seguinte.
Sabe aquele apagão do que aconteceu na noite anterior? Também é por causa do aumento dessas substâncias inflamatórias, assim como alteração de humor, deixando-o bem irritado.
E por que piora quando ficamos mais velhos?
Agora imagina esses processos acontecendo durante muitos anos de forma regular. A boa e velha frase se aplica: “nem todo mundo é de ferro”. O fígado de uma pessoa com 80 anos de idade não é igual ao fígado de um jovem de 20 e poucos anos, por exemplo.
Assim como ficamos mais velhos, nossos órgãos também envelhecem. A metabolização do álcool fica mais lenta conforme a idade, o que faz com que você fique ainda mais “estragado” no dia posterior da bebedeira.
“Além disso, outras particularidades vão acontecendo conforme a idade, como a maior facilidade de se desidratar, maior fragilidade do estômago e maior perda de massa muscular e aumento de gordura no organismo”, afirma a Dra. Themis Torres.
A médica diz que as mulheres e os idosos têm maior quantidade de gordura no organismo, e isso favorece a absorção do álcool.
Outra explicação possível é que, depois do consumo da mesma quantidade de álcool, os idosos atingem uma maior alcoolemia do que os jovens (presença da substância no sangue). Esse fato é decorrente da perda de água que o corpo passa a manifestar ao longo dos anos.
“Os indivíduos com 65 anos ou mais estão mais sujeitos à embriaguez e aos efeitos adversos das bebidas alcoólicas. Além disso, um estudo sul-coreano concluiu que a capacidade do fígado de produzir enzimas e antioxidantes que decompõe o álcool em acetaldeído diminui com a idade.”, complementa a Dra. Erica Siu.
Se você está querendo uma fórmula mágica para deixar de ter esses efeitos da ressaca, a má notícia é que ela não existe. Não tem jeito. O negócio é não exagerar na bebedeira e entender que sua mente pode ser de jovem, mas seu corpo já não é mais o mesmo.
As dicas das especialistas para reduzir o desconforto são as seguintes: se hidratar durante e após o consumo de bebida alcoólica (estima-se que aproximadamente a cada 4 doses, sejam eliminados de 600 a 1000 ml de água em algumas horas), além de não consumir álcool de barriga vazia – a comida diminui a absorção da substância.
Outras dicas para evitar ou curar uma mega ressaca você encontra aqui, aqui, aqui e aqui.